15 de abril de 2008

Oito meses de prisão - Caso Gisberta

" Oito meses de prisão por nada ter feito para socorrer Gisberta

por Nuno Silva
in JN

Uma "atitude cobarde", de indiferença perante o "definhar de um ser humano". Foi com termos desta natureza que o presidente do colectivo de juízes sustentou, ontem, os oito meses de prisão aplicados ao jovem de 18 anos acusado de envolvimento na morte do transexual Gisberta, em Fevereiro de 2006. A pena foi mais pesada do que a pedida pelo Ministério Público, que tinha sugerido que o arguido acompanhasse o trabalho de uma instituição de apoio a sem-abrigo, durante seis meses.Condenado apenas pelo crime de omissão de auxílio, por ter assistido várias vezes às agressões perpetradas pelos colegas, sem ter prestado socorro à vítima, Vítor S. viu, contudo, o tribunal dar-lhe a possibilidade de cumprir a pena em prisão domiciliária (mora na Oficina S. José), em vez de ir para a cadeia. Aos oito meses terão de ser descontados os dois meses e cinco dias em que ele esteve em prisão preventiva.Na leitura da sentença, o juiz-presidente da 4ª Vara, João Grilo, explicou que não foi reunida prova para condenar o jovem pelos três crimes de ofensa à integridade física qualificada de que era acusado, correspondentes a outros tantos dias de maus-tratos. "Não foi possível apurar a sua intervenção concreta", justificou. O magistrado não deixou de reiterar a "memória selectiva" das testemunhas (os outros menores envolvidos nos maus-tratos), que, se por um lado "esqueceram" muitos pormenores dos factos, por outro não tiveram dúvidas em ilibar Vítor dos maus-tratos a Gisberta. Os depoimentos dos rapazes foram definidos como omissos, desconexos, incoerentes, imprecisos e inverosímeis. "Não convenceram o tribunal", realçou João Grilo.Não revelou emoção. O presidente do colectivo revelou, ainda, que foi colocada a hipótese de condenar o arguido por co-autoria. No entanto, chegou-se à conclusão de que a sua participação "não foi determinante para o resultado". Ou seja, "para ser punido como cúmplice era preciso que a sua presença fosse indispensável" para os actos. Dúvidas não houve, por outro lado, quanto ao crime de omissão de auxílio (pena até um ano de prisão). Vítor era o mais velho do grupo de 14 jovens (na altura tinha 16 anos), mas assistiu à agonia galopante de Gisberta, resultante da agressão "selvática e desumana", sem nada ter feito para evitar o desfecho, por ter receio de ser responsabilizado. O juiz-presidente frisou que o jovem podia ter alertado o vigilante do edifício onde tudo aconteceu ou um dos seus monitores na Oficina de S. José. Já o arrependimento assumido pelo arguido, "não revelou emoção". "A sua culpa foi intensa", concluiu o colectivo, que decidiu não aplicar uma pena suspensa dada a gravidade dos factos e a necessidade da "prevenção geral". No final da sessão, Patrícia Castiajo, advogada de Vítor S., reagiu com inconformismo à pena aplicada e admitiu apresentar recurso. "A mediatização do caso não ajudou. Houve uma pressão enorme para se condenar. Alguém tinha de pagar e o Vítor era o único imputável", afirmou a causídica, sublinhando que o jovem "foi o único que não bateu" na vítima. Patrícia Castiajo considera que o trabalho comunitário seria a pena mais adequada."

2 comentários:

Paula Baltazar Martins disse...

Assim vai a justiça em Portugal...
Para mim pior do que o acto de matar, foi humilhar, foi a indiferença sentida perante o sofrimento de alguém, a crueldade da violência, a frieza...
É vergonhosa a pena aplicada perante tais actos!
É nestes momentos que eu fico triste por não acreditar na justiça divina, já que a humana insiste em falhar.

Memory disse...

Foi demasiado branda a pena aplicada. Devia ter sido exemplar, mas é a justiça que temos em Portugal. Embora o jovem fosse menor na altura, não teve qualquer pejo em evitar tal acto barbaro.